Um levantamento alarmante divulgado pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica do Estado do Tocantins (Saeto) 2024 mostra que 62 dos 139 municípios tocantinenses — o equivalente a 44,60% — apresentaram queda no percentual de crianças com nível adequado de alfabetização em comparação com o ano anterior. A regressão acende um alerta no Ministério Público do Tocantins (MPTO), que prepara ações para intensificar a fiscalização e o apoio técnico às redes municipais de ensino, sobretudo nas localidades com os piores desempenhos.
A análise, realizada pela Secretaria de Estado da Educação (Seduc), avaliou 17.673 alunos do 2º ano do ensino fundamental, estabelecendo um comparativo entre os resultados de 2023 e 2024. A média da queda entre os 62 municípios que regrediram foi de 25,49%. Em outras palavras, uma em cada quatro crianças avaliadas nesses locais deixou de atingir o nível adequado de alfabetização em apenas um ano.
O caso mais grave foi registrado em Chapada de Areia, que viu seu índice despencar de 56,25% para 6,25% — uma queda de 88,89%. Mateiros (–77,85%) e Monte do Carmo (–68,24%) completam o trágico pódio do declínio educacional. Outros municípios com quedas significativas incluem Ipueiras (–64,58%) e Itaporã do Tocantins (–62,35%).
Diante desse cenário, o Centro de Apoio Operacional da Infância, Juventude e Educação (Caopije) do MPTO está coordenando uma mobilização institucional com produção de materiais de apoio e planejamento de eventos que visam reforçar a atuação das Promotorias de Justiça em todo o estado.
“Queremos atuar com mais intensidade nas localidades onde a situação se mostra mais crítica. Estamos estruturando kits de suporte para os promotores e buscando meios de garantir políticas públicas mais eficazes”, afirmou o promotor Sidney Fiore Júnior, coordenador do Caopije.
A atuação do MPTO está alinhada às diretrizes do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que definiu a alfabetização como uma das prioridades na agenda de defesa dos direitos fundamentais.
Segundo análise do próprio Caopije, diversos fatores contribuíram para o retrocesso. Entre eles estão: deficiências na gestão educacional local, precariedade do transporte escolar — agravada por chuvas intensas que afetam o acesso às escolas —, enfraquecimento das estruturas educacionais rurais e, principalmente, a descontinuidade de políticas educacionais após as últimas eleições municipais.
“Há muitos municípios que passaram por troca de prefeitos e secretários de educação, o que frequentemente interrompe programas em andamento. Quando não há continuidade, perde-se o avanço conquistado com muito esforço”, destaca Fiore.
Se por um lado o retrocesso preocupa, há também sinais de progresso. Em 75 municípios — 53,96% do total — houve avanço nos índices de alfabetização, com uma média de crescimento de 54,95%. Recursolândia foi o destaque positivo, com um salto de 350,74% no número de crianças alfabetizadas adequadamente, seguido por Porto Alegre do Tocantins (+310,09%) e Crixás do Tocantins (+184,57%).
O Saeto foi criado com o propósito de oferecer um diagnóstico preciso da educação básica no Tocantins, subsidiando a formulação de políticas públicas. Além de servir como termômetro da alfabetização, o sistema também influencia diretamente a partilha de recursos do ICMS entre os municípios, criando incentivos para a melhoria da qualidade do ensino nas redes locais.
O quadro geral, no entanto, revela que ainda há um longo caminho a percorrer. A alfabetização infantil, direito essencial para a formação plena do cidadão, segue ameaçada em muitas cidades tocantinenses. A resposta a essa crise — como indica o MP — deve ser firme, articulada e, acima de tudo, contínua. Porque alfabetizar uma criança no tempo certo é mais que ensinar a ler: é garantir a ela um futuro possível.