A Justiça Federal determinou a readmissão imediata de uma estudante cotista ao curso de Nutrição da Universidade Federal do Tocantins (UFT), após a universidade excluí-la com base em parecer de uma comissão de heteroidentificação racial. A decisão, proferida no domingo (4) pelo juiz federal Adelmar Aires Pimenta da Silva, suspende os efeitos do ato administrativo e impõe prazo de 10 dias para a reintegração da aluna, sob pena de multa.
A estudante ingressou na UFT no primeiro semestre de 2025, pelo sistema de cotas raciais para pessoas pardas e negras, e já cursava há três meses quando foi surpreendida pela decisão da comissão. O colegiado avaliou que a candidata não possuía traços fenotípicos compatíveis com a autodeclaração racial apresentada no ato da inscrição, e recomendou sua exclusão do curso.
Na ação judicial, a defesa alegou que a exclusão foi tardia, arbitrária e ilegal, já que a análise ocorreu após a matrícula e o início das aulas, em desacordo com o próprio edital do processo seletivo. Apontou ainda que a decisão da comissão careceu de critérios objetivos e de fundamentação, ferindo princípios como a segurança jurídica e o devido processo legal. Argumentou também que a estudante possui características fenotípicas compatíveis com a identidade racial declarada.
Para reforçar sua posição, a aluna buscou registrar uma ata notarial, documento que permitiria a um tabelião registrar, de forma oficial, suas características físicas observáveis. No entanto, cartórios de Palmas recusaram-se reiteradamente a lavrar o documento, sem apresentar justificativa formal. Diante da negativa, o juiz determinou a lavratura imediata da ata notarial, fixando multa diária de R$ 500,00 em caso de descumprimento.
Em sua decisão, o magistrado citou entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal (STF), segundo o qual, “havendo dúvida razoável, a autodeclaração deve prevalecer”. A decisão também ordena o envio do caso à Corregedoria de Justiça do Tocantins, para apuração da conduta dos tabeliães que se recusaram a cumprir a função pública.
A sentença representa um importante precedente sobre os limites da atuação das comissões de heteroidentificação e os cuidados necessários para preservar direitos assegurados por lei, sobretudo no que diz respeito ao acesso de pessoas negras e pardas ao ensino superior por meio de ações afirmativas.