O Ministério Público do Tocantins (MPTO) abriu uma investigação que promete mexer com os bastidores políticos do Estado. O órgão instaurou o Inquérito Civil Público nº 5389/2025 para apurar falta de transparência e possíveis irregularidades na aplicação das emendas parlamentares individuais dos deputados estaduais, recursos que chegam a R$ 10 milhões anuais para cada parlamentar.
A apuração, conduzida pela 9ª Promotoria de Justiça da Capital, está sob responsabilidade do promotor Vinícius de Oliveira e Silva e foi instaurada no último 3 de outubro, a partir de uma denúncia anônima recebida pela Ouvidoria do MP. A representação aponta que a Assembleia Legislativa do Tocantins (Aleto) não divulga de forma clara como esses valores estão sendo utilizados, nem quais municípios, programas e entidades são beneficiados.
A investigação tem como alvo principal a falta de transparência sobre a destinação das emendas e a forma como são executadas. O Ministério Público quer saber quem está sendo beneficiado e em que condições.
O foco inclui áreas com histórico de uso político, como eventos, shows e compra de cestas básicas, esta última já investigada em outras frentes, como a Operação Fames-19, que resultou no afastamento do governador Wanderlei Barbosa (Republicanos).
Na portaria de instauração, o promotor determinou que sejam requisitadas informações detalhadas à Assembleia Legislativa, à Secretaria de Planejamento e Orçamento (Seplan) e ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-TO). O MPTO exige que sejam informados:
Autores das emendas e valores destinados;
Programas, ações e localidades beneficiadas;
Modalidade de transferência dos recursos;
Andamento da execução das emendas;
E o link público onde essas informações estão disponíveis aos cidadãos.
“O objetivo é garantir o cumprimento dos princípios da legalidade, moralidade e transparência, permitindo que qualquer cidadão possa acompanhar o uso dessas verbas públicas”, destacou o promotor.
A resposta inicial da Assembleia Legislativa, segundo o MP, foi a de que a responsabilidade pela divulgação das informações caberia à Seplan. No entanto, o Ministério Público entende que ambos os órgãos — Legislativo e Executivo têm o dever de dar publicidade às informações, conforme prevê a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011).
O caso reacende um tema delicado: a influência política sobre o destino das emendas individuais, que, na prática, se tornaram uma das moedas de poder mais fortes do Legislativo. Com cerca de R$ 240 milhões por ano em jogo (somando os 24 deputados estaduais), a investigação tende a gerar tensões entre o MP e a classe política, já que questiona um dos mecanismos mais estratégicos de articulação entre parlamentares e prefeitos.
O inquérito surge em meio à divulgação do Índice de Transparência e Governança Pública de 2025, da Transparência Internacional Brasil, que colocou o Tocantins em 21º lugar nacional, com apenas 57,5 pontos, bem abaixo de estados vizinhos como Goiás, que alcançou 93,4 pontos e ocupa a 2ª posição.
O relatório da entidade cita justamente a falta de transparência sobre emendas parlamentares e obras públicas como um dos maiores problemas do país.
A investigação do MPTO ainda não aponta deputados ou gestores específicos, mas o teor da portaria deixa claro que há desconfiança institucional sobre o uso político desses recursos. Ao acionar o TCE, o MPTO busca saber se há algum controle efetivo sobre a execução das emendas e se o repasse dos valores atende aos critérios legais.
A movimentação do Ministério Público é vista como um sinal de pressão sobre a Assembleia Legislativa e o Palácio Araguaia, num momento em que o debate sobre moralidade administrativa e uso do orçamento público ganha força em todo o país.
O caso promete expor as engrenagens internas do poder político tocantinense, onde as emendas, mais do que instrumentos de investimento, têm sido usadas como ferramentas de influência e capital eleitoral.
Embora o inquérito ainda esteja em fase inicial e não haja acusação formal contra nenhum parlamentar, o gesto do MPTO é simbólico. Ele marca um freio institucional em um sistema de repasses bilionários que opera há anos com baixo nível de transparência.
No fundo, o que se investiga não é apenas onde o dinheiro foi parar, mas como a política estadual tem se valido dessas emendas para manter alianças e consolidar poder.
Se o Ministério Público avançar com ações civis ou recomendações, o impacto será direto sobre o relacionamento entre o Executivo, o Legislativo e os municípios e poderá redefinir o modo como os recursos públicos são distribuídos no Tocantins.