Delvânia Campelo da Silva, 50 anos, passou os últimos vinte dias de vida em agonia dentro de uma UTI, lutando para sobreviver aos golpes brutais que sofreu em Caseara, interior do Tocantins. Foi espancada com um cabo de rodo. Teve a cabeça fraturada. O agressor fugiu, mas a brutalidade ficou, como marca insuportável daquilo que chamamos de feminicídio — e que, em verdade, é um massacre silencioso, contínuo e tolerado.
A morte de Delvânia não é um acidente, não é um desvio da ordem — é a ordem. A ordem de um sistema que permite que mulheres sejam tratadas como propriedade, que se silencia diante das ameaças, que relativiza denúncias e que transforma corpos femininos em alvos de fúria.
O feminicídio não é uma fatalidade. É o resultado de uma cultura que ainda educa homens para dominar, punir e matar. O Brasil, ano após ano, lidera rankings de assassinatos de mulheres na América Latina. No Tocantins, a realidade é tão brutal quanto invisibilizada: faltam políticas públicas eficazes, faltam centros de acolhimento, faltam redes de proteção. E, acima de tudo, falta vontade de transformar.
O assassinato de Delvânia deveria ser tratado como o que é: um grito. Um chamado. Um soco na consciência coletiva. Ela não era estatística, como bem destacou a Secretaria da Mulher. Ela era filha, talvez mãe, amiga, cidadã — alguém que tinha o direito de envelhecer, de viver em paz, de simplesmente existir.
Quantas Delvânias mais serão necessárias para que se leve a sério o feminicídio? Quantas mortes até que o Estado deixe de lavar as mãos?
Hoje, o Tocantins enterra mais do que uma mulher. Enterra também um pouco da esperança de que este país se torne, enfim, um lugar seguro para quem é mulher.