A aprovação da chamada PEC da Blindagem pela Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (16), revelou algo que merece reflexão: a unanimidade da bancada tocantinense em favor de uma proposta que, na prática, torna mais difícil processar e até prender parlamentares.
Foram oito votos a favor, nenhum contra, nenhum gesto de dúvida ou independência. Uma rara unidade que, curiosamente, não se vê quando o tema é a saúde pública, a infraestrutura das cidades ou o drama das famílias que aguardam vagas em creches e hospitais.
Enquanto milhões de brasileiros enfrentam filas no SUS, atraso em obras e aumento no custo de vida, o Congresso Nacional concentrou esforços para votar em tempo recorde, em dois turnos, na mesma noite uma PEC que protege os próprios parlamentares.
Na prática, a proposta devolve à Câmara e ao Senado o poder de autorizar, ou não, a abertura de ações penais contra deputados e senadores. Também permite que decidam, em votação secreta, se um colega preso em flagrante deve ou não continuar preso.
É difícil explicar ao cidadão comum, que paga impostos e enfrenta a dureza do dia a dia, que esse é o tema prioritário em Brasília. Que, em meio à crise econômica e social, nossos representantes escolheram votar algo que os torna menos vulneráveis à Justiça.
Os defensores da medida falam em "restabelecer o equilíbrio entre os Poderes" e "proteger o mandato contra perseguições políticas". Mas é impossível ignorar que a PEC também blinda parlamentares de responder por crimes como corrupção, peculato ou violência, a não ser que a própria Casa autorize.
A mensagem que passa é ruim: em vez de aproximar o Legislativo do eleitor, cria-se um muro, um escudo que isola os representantes do povo de qualquer risco de responsabilização.
No Tocantins, essa votação unânime é simbólica. Mostra que, quando o assunto é defender os próprios interesses, a bancada consegue se alinhar como raramente se vê. Mas o que se espera dessa mesma unidade é que seja usada para destravar investimentos, melhorar estradas, garantir recursos para saúde e educação.
O eleitor tocantinense, que sofre com pontes interditadas, rodovias esburacadas e hospitais superlotados, precisa se perguntar: essa votação fala em meu nome?
O resultado na Câmara é um lembrete incômodo: parte do Congresso parece viver em outra realidade, alheia às urgências do país. Se a PEC passar no Senado, caberá ao povo nas próximas eleições decidir se aceita essa blindagem ou se quer um Parlamento mais transparente e conectado às suas dores.