Há momentos na política em que o poder não é tomado, mas simplesmente escorre pelos dedos. É o que se vê no caso de Wanderlei Barbosa, um governador afastado que já não governa, um líder sem legião, um homem que ainda ocupa manchetes, mas não mais os bastidores onde as decisões reais acontecem.
A negativa do habeas corpus pelo ministro Luís Roberto Barroso não foi apenas uma decisão jurídica. Foi um recado, daqueles que o Supremo costuma dar sem levantar a voz: as provas existem, e o argumento do coitadismo já não convence. Ao citar o relatório do ministro Mauro Campbell, Barroso deixou claro que não há “teratologia” nem “abuso de poder”, apenas indícios robustos de que Wanderlei se perdeu no mesmo labirinto ético que engoliu seus antecessores.
Wanderlei chegou ao governo por acidente histórico e parece destinado a sair dele pelo mesmo mecanismo. Sempre confiou mais na popularidade do que na estratégia, mais na simpatia do que na prudência. Mas a política, ingrata e amnésica, tem o hábito de trocar seus heróis na primeira ventania.
Hoje, o silêncio da Assembleia é o mais eloquente dos discursos. O presidente Amélio Cayres diz que não há pressão pelo impeachment o que, traduzido do dialeto parlamentar, significa apenas: “ainda não”. Porque, quando o cheiro de fraqueza começa a circular pelos corredores do poder, a fidelidade se torna questão de agenda, não de convicção.
E Wanderlei, que há poucos meses distribuía promessas e articulava sucessão, agora mal caberia como coadjuvante nas chapas de Dorinha, Gaguim ou Eduardo Gomes. O poder, como se sabe, não suporta o vácuo.
Fala-se nos bastidores que renunciar seria o gesto mais sensato e, ironicamente, o mais digno. Mas Wanderlei não é homem de renúncias calculadas. É movido por impulso, mais afeito à teimosia do que à tática. E talvez por isso mesmo esteja prestes a transformar uma derrota previsível em tragédia anunciada.
A renúncia precoce poderia livrá-lo da inelegibilidade e preservar, ao menos, a chance de reconstruir o nome. Mas se o instinto for o de resistir até o fim, restará a ele apenas o papel do mártir tardio, aquele que confunde a própria queda com injustiça divina e tenta redimi-la com versículos e selfies de fé.
O Tocantins já viu esse filme. Governadores caem, aliados se dissipam, e a política recomeça, sempre igual a si mesma. O espetáculo é o mesmo, apenas com novos atores tentando parecer diferentes.
No caso de Wanderlei, o desfecho parece já escrito: ou sai por decisão própria, com o mínimo de controle sobre o roteiro, ou será expulso do palco pela força das circunstâncias, sem aplausos, sem tragédia, apenas com o constrangimento do esquecimento.
E quem sabe, entre um processo e outro, sobre ainda tempo para o que ele mais aprecia: um fim de tarde em Taquaruçu, o sossego do Catoá em Campo Alegre, o burburinho do rio e a paz que só o afastamento do poder pode proporcionar. Porque, às vezes, o verdadeiro privilégio não está em governar, mas em observar, de longe, o quanto o poder é, afinal, uma ilusão passageira.