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08/07/2025 às 19h41min - Atualizada em 08/07/2025 às 19h41min

O espelho rachado da esquerda brasileira

Thiago de Castro

Thiago de Castro

Colunista e Editor do Jornal Correio do Tocantins

Era uma tarde abafada de julho, dessas em que o asfalto ferve e a esperança evapora. O rádio do vizinho gritava mais uma fala de um ministro com cara de gerente do Itaú. Na televisão, um deputado "progressista" sorria ao lado de banqueiros, como se ali estivesse prestes a anunciar um novo plano de inclusão — para o mercado, é claro. A esquerda, essa velha senhora de tantas lutas e desilusões, sentava-se calada à beira do caminho, vestida com um terno remendado de ideologias que já não conversam entre si.

 

Lembro de quando ela tinha um brilho nos olhos. Defendia operários, sonhava com reforma agrária, gritava contra a fome. Hoje, essa mesma senhora parece cansada, perdida entre o marketing de causas identitárias e o pragmatismo de cargos e emendas. Carrega nas costas uma bolsa cheia de palavras de ordem recicladas, como quem tenta provar que ainda está viva — mas vive sob aparelhos.

 

Assusta vê-la bajular os donos do poder econômico com a mesma destreza com que desdenha do povo simples que não sabe conjugar pronomes neutros. O trabalhador que sua no sol e reza na beira da cama já não se reconhece nesse discurso cheio de códigos acadêmicos e promessas vazias. A esquerda virou gerente do sistema, e disso não se pode fazer poesia.

 

Outro dia, vi uma cena que me doeu mais que inflação: um jovem, desses que ainda tem fé em utopias, perguntava o que restava da luta popular. Recebeu como resposta uma sequência de siglas, comissões, termos em inglês e um convite para um seminário sobre desconstrução. Ele foi embora calado, como quem sai de um velório sem saber quem morreu.

 

Talvez tenha sido a alma. Talvez tenha sido a coragem de romper com o sistema, e não apenas administrá-lo com mais tato. O que é certo é que essa esquerda, hegemonizada por quem um dia teve o povo como chão e hoje tem o mercado como teto, já não emociona, não comove, não convoca. Apenas gere. E gere mal.

 

Falta-lhe humildade para ouvir. Falta-lhe coerência para agir. Falta-lhe, sobretudo, a capacidade de se olhar no espelho — e não ver mais ali a imagem de quem prometeu mudar o mundo, mas se perdeu tentando caber nele.

 

E o espelho... bem, o espelho está rachado.

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