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16/10/2025 às 12h07min - Atualizada em 16/10/2025 às 12h07min

O teatro das pesquisas e a fabricação da opinião no Tocantins

Quando a estatística vira arma e o eleitor, alvo

Thiago de Castro

Thiago de Castro

Colunista e Editor do Jornal Correio do Tocantins

No Tocantins, a eleição de 2026 ainda está distante no calendário, mas o campo de batalha já foi aberto.

De um lado, políticos testam seus nomes em sondagens “independentes”. De outro, portais de notícias publicam números de institutos criados às pressas, muitos sem credibilidade técnica ou registro na Justiça Eleitoral.

O resultado é o que já se tornou rotina no Estado: a guerra das pesquisas e, como toda guerra, a verdade é a primeira vítima.

A manipulação disfarçada de estatística

As pesquisas, que deveriam medir o pulso da sociedade, foram transformadas em instrumentos de convencimento.
Hoje, servem mais para fabricar a sensação de vitória antecipada do que para retratar o que o eleitor realmente pensa.

O eleitor, atordoado por manchetes e gráficos, é exposto a uma espécie de psicologia eleitoral: números que não informam, mas moldam percepções. O objetivo não é refletir a realidade é produzi-la.

Quando uma pesquisa coloca certo nome em primeiro lugar, ela não apenas mostra o que existe.
Ela tenta fazer existir. É a manipulação travestida de ciência.

O caso emblemático de Palmas em 2024

A eleição municipal de 2024 em Palmas foi o retrato mais nítido dessa distorção. Durante meses, uma verdadeira romaria de institutos se revezou na divulgação de números conflitantes, cada qual com seu “favorito do momento”.

Alguns apontavam ampla vantagem de determinado candidato; outros indicavam empates improváveis.

Muitos desses levantamentos foram encomendados por grupos políticos e publicados em portais alinhados, numa tentativa clara de influenciar o pleito. O resultado veio das urnas: todos erraram.

A realidade desmontou o teatro das porcentagens e revelou o óbvio, que a manipulação estatística é apenas mais uma forma de propaganda disfarçada.

O episódio deixou marcas: o eleitor palmense passou a duvidar não só das pesquisas, mas também da própria imprensa que as divulgou.

O teatro dos números

No Tocantins, multiplicam-se institutos de ocasião — entidades sem sede, sem equipe técnica e sem histórico público de levantamentos. Apresentam-se como “centros de análise” ou “institutos independentes”, mas em muitos casos são comandados por assessores, comunicadores e cabos eleitorais.

Com poucos recursos e muito interesse, produzem números de aparência profissional, amplificados nas redes sociais e em blogs políticos. É o marketing de bastidor usando a máscara da estatística.

A lei, ao permitir brechas sob o rótulo de “pesquisas de imagem” ou “avaliações administrativas”, acaba servindo de abrigo para essa prática. São campanhas disfarçadas de ciência e o eleitor é o último a perceber.

A vitória fabricada

A lógica é simples e perversa: mostre quem “vai ganhar” e parte do eleitorado se inclina para esse lado. É o efeito manada, a psicologia da vitória fabricada.

O número vira argumento, e o favoritismo se transforma em destino. Mas quando a base é duvidosa, o que se constrói não é opinião pública é opinião fabricada.

O voto, que deveria nascer da consciência, torna-se reflexo condicionado à ilusão de maioria.

O vício da antecipação

Vivemos tempos apressados, até a democracia parece querer chegar antes da hora. A campanha já começou sob o nome de “pré-campanha”, e as pesquisas, que deveriam surgir no calor do debate, aparecem um ano antes das urnas.

Cada gráfico postado nas redes é um pequeno comício digital, sem direito de resposta e sem compromisso com o real.
Enquanto se discute quem lidera, esquece-se de discutir o que cada um propõe. Enquanto se divulga quem “cresceu três pontos”, ninguém pergunta em que acredita esse candidato.

O preço da desconfiança

A guerra das pesquisas deixa um rastro de cinismo. O eleitor já não acredita em nada, nem nas pesquisas falsas, nem nas sérias.

O jornalismo responsável paga o preço das manipulações alheias. E o descrédito se torna o novo normal, um terreno fértil para a mentira organizada.

Sem confiança, a política se esvazia. Sem verdade, a democracia se transforma em teatro. As pesquisas, quando distorcidas, não são apenas erro técnico, são um golpe silencioso contra a fé pública.

O Tocantins como espelho

O Tocantins é um retrato do Brasil em miniatura: alianças voláteis, rupturas, desconfiança. Nesse ambiente, a pesquisa eleitoral vira arma de guerra.

Agora, em 2025, a disputa de 2026 já começou nos bastidores: institutos ligados a partidos e pré-candidatos produzem levantamentos “espontâneos” com aparência de neutralidade. É a velha técnica da antecipação plantar a sensação de vitória para colher o voto do indeciso.

Mas, como nas eleições de Palmas, a verdade sempre chega. E quando chega, vem pelas urnas: frias, silenciosas, imunes às mentiras de laboratório.

A urgência de resgatar a ética da medição

A democracia não sobrevive sem confiança. As pesquisas não são inimigas da verdade; o problema é o uso que se faz delas.

O Tocantins precisa resgatar a ética da medição: transparência de método, auditoria independente, divulgação dos financiadores e respeito ao eleitor.

Até lá, o cidadão seguirá assistindo à guerra dos números, onde as estatísticas são munição e o voto, alvo.

Mas talvez, no silêncio das urnas, repouse a única pesquisa verdadeira: aquela que nenhum instituto consegue manipular.

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